Com relação ao jogo, Piaget (1998) acredita que ele é
essencial na vida da criança. De início tem-se o jogo de exercício que é
aquele em que a criança repete uma determinada situação por puro prazer, por
ter apreciado seus efeitos.
Em torno dos 2-3 e 5-6 anos nota-se a ocorrência dos jogos
simbólicos, que satisfazem a necessidade da criança de não somente relembrar o
mentalmente o acontecido, mas de executar a representação.
Em período posterior surgem os jogos de regras , que são transmitidos
socialmente de criança para criança e por conseqüência vão aumentando de
importância de acordo com o progresso de seu desenvolvimento social. Para Piaget, o jogo constitui-se em expressão e
condição para o desenvolvimento infantil , já que as crianças quando jogam
assimilam e podem transformar a realidade.
Já Vygotsky (1998), diferentemente de Piaget, considera que o
desenvolvimento ocorre ao longo da vida e que as funções psicológicas
superiores são construídas ao longo dela. Ele não estabelece fases para explicar
o desenvolvimento como Piaget e para ele o sujeito não é ativo nem passivo: é
interativo.
Segundo ele, a criança usa as interações sociais como formas
privilegiadas de acesso a informações: aprendem a regra do jogo, por exemplo,
através dos outros e não como o resultado de um engajamento individual na
solução de problemas. Desta maneira, aprende a regular seu comportamento
pelas reações, quer elas pareçam agradáveis ou não.
Enquanto Vygotsky fala do faz-de-conta, Piaget fala
do jogo simbólico, e pode-se dizer, segundo Oliveira (1997) ,que são
correspondentes.
“O brinquedo cria uma Zona de Desenvolvimento Proximal na criança”.
(Oliveira, 1977: 67), lembrando que ele afirma que a aquisição do conhecimento
se dá através das zonas de desenvolvimento: a real e a proximal. A zona
de desenvolvimento real é a do conhecimento já adquirido, é o que a pessoa traz
consigo, já a proximal, só é atingida, de início, com o auxílio de outras
pessoas mais “capazes”, que já tenham adquirido esse conhecimento.
“As maiores aquisições de uma criança são
conseguidas no brinquedo, aquisições que no futuro tornar-se-ão seu nível
básico de ação real e moralidade (Vygotsky, 1998).
Piaget (1998) diz que a atividade lúdica é o berço obrigatório das
atividades intelectuais da criança, sendo, por isso, indispensável à
prática educativa (Aguiar, 1977: 58).
Na visão sócio- histórica de Vygotsky, a brincadeira, o jogo, é uma
atividade específica da infância, em que a criança recria a realidade usando
sistemas simbólicos. Essa é uma atividade social, com contexto cultural e
social. É uma atividade humana criadora, na qual imaginação, fantasia e
realidade interagem na produção de novas possibilidades de interpretação, de
expressão e de ação pelas crianças, assim como de novas formas de
construir relações sociais com outros sujeitos, crianças e adultos.
Para Vygotsky, citado por Wajskop (1999:35): ...a brincadeira cria para
as crianças uma zona de desenvolvimento proximal que não é outra coisa senão a
distância entre o nível atual de desenvolvimento, determinado pela capacidade
de resolver independentemente um problema, e o nível de desenvolvimento
potencial, determinado através da resolução de um problema, sob a orientação de
um adulto, ou de um companheiro mais capaz.
Vygotsky, citado por Lins (1999), classifica o brincar em algumas fases:
durante a primeira fase a criança começa a se distanciar de seu primeiro meio
social, representado pela mãe, começa a falar, andar e movimentar-se em volta
das coisas. Nesta fase, o ambiente a alcança por meio do adulto e pode-se dizer
que a fase estende-se até em torno dos sete anos. A segunda fase é
caracterizada pela imitação, a criança copia os modelos dos adultos. A terceira
fase é marcada pelas convenções que surgem de regras e convenções a elas
associadas.
Vygotsky (1989: 109), ainda afirma que: é enorme a influência do
brinquedo no desenvolvimento de uma criança. É no brinquedo que a criança
aprende a agir numa esfera cognitiva, ao invés de numa esfera visual externa,
dependendo das motivações e tendências internas, e não por incentivos
fornecidos por objetos externos”.
A noção de “zona proximal de desenvolvimento” interliga-se portanto, de
maneira muito forte, à sensibilidade do professor em relação às
necessidades e capacidades da criança e à sua aptidão para utilizar as
contingências do meio a fim de dar-lhe a possibilidade de passar do que
sabe fazer para o que não sabe. (Pourtois, 199: 109).
As brincadeiras que são oferecidas à criança devem estar de acordo com a
zona de desenvolvimento em que ela se encontra e estimular para o
desenvolvimento do ir além; desta forma, pode-se perceber a importância do
professor conhecer a teoria de Vygotsky.
No processo da educação infantil o papel do professor é de suma importância,
pois é ele quem cria os espaços, disponibiliza materiais, participa das
brincadeiras, ou seja, faz a mediação da construção do conhecimento.
A desvalorização do movimento natural e espontâneo da criança em favor
do conhecimento estruturado e formalizado, ignora as dimensões educativas da
brincadeira e do jogo como forma rica e poderosa de estimular a atividade
construtiva da criança. É urgente e necessário que o professor procure ampliar
cada vez mais as vivências da criança com o ambiente físico, com brinquedos,
brincadeiras e com outras crianças.
O jogo, compreendido sob a ótica do brinquedo e da criatividade, deverá
encontrar maior espaço para ser entendido como
educação, na medida em que os professores compreenderem melhor toda sua
capacidade potencial de contribuir para com o desenvolvimento da criança.
NEGRINE (1994:20), em estudos realizados sobre aprendizagem e
desenvolvimento infantil, afirma que "quando a criança chega à escola,
traz consigo toda uma pré-história, construída a partir de suas vivências,
grande parte delas através da atividade lúdica".
Segundo esse autor, é fundamental que os professores tenham conhecimento
do saber que a criança construiu na interação com o ambiente familiar e
sociocultural, para formular sua proposta pedagógica.
Entendemos, a partir dos princípios aqui expostos, que o professor
deverá contemplar a brincadeira como princípio norteador das atividades
didático-pedagógicas, possibilitando às manifestações corporais encontrarem
significado pela ludicidade presente na relação que as crianças mantêm
com o mundo.
Porém essa perspectiva não é tão fácil de ser adotada na prática.
Podemos nos perguntar: como colocar em prática uma proposta de educação
infantil em que as crianças desenvolvam, construam/adquiram conhecimentos e se
tornem autônomas e cooperativas?
Como os professores favorecerão a construção de conhecimentos se não forem
desafiados a construírem os seus?
O caminho que parece possível implica pensar a
formação permanente dos profissionais que nela atuam.
“é preciso que os profissionais de educação infantil tenham acesso ao
conhecimento produzido na área da educação infantil e da cultura em geral, para
repensarem sua prática, se reconstruírem enquanto cidadãos e atuarem enquanto
sujeitos da produção de conhecimento. E para que possam, mais do que
"implantar" currículos ou "aplicar" propostas à realidade
da creche/pré-escola em que atuam, efetivamente participar da sua concepção,
construção e consolidação”. (Kramer apud MEC/SEF/COEDI, 1996 p.19).
Referências bibliográficas:
KRAMER, Sonia. Currículo de Educação Infantil e a Formação dos
Profissionais de Creche e Pré-escola: questões teóricas e polêmicas. In:
MEC/SEF/COEDI. Por uma política de formação do profissional de Educação
Infantil. Brasília-DF. 1994a
LINS, Maria Judith Sucupira da Costa. 1999. O direito de brincar:
desenvolvimento cognitivo e a imaginação da criança na perspectiva de Vygotsky.
In: XIII CONGRESSO BRASILEIRO DE EDUCAÇÃO INFANTIL DA OMEP. Paraíba. Anais do
XIII Congresso Brasileiro de Educação Infantil da OMEP. p. 41-47.
NEGRINE, Airton. Aprendizagem e desenvolvimento infantil. Porto Alegre:
Prodil, 1994.
OLIVEIRA, Zilma de Moraes Ramos de (org). 2000. Educação infantil:
muitos olhares. 4.ed. São Paulo: Cortez.
Piaget, J. A psicologia da criança. Ed Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,
1998.
Pourtois & Desmet. A educação pós-moderna. Loyola, 1999.
VYGOTSKY, L. 1989. A formação social da mente. São Paulo: Martins
Fontes.